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Diário do Deusão

PRIMEIRO DIA

Eu estou pensando seriamente em criar um mundo. Mas talvez um mundo seja pequeno demais para abrigar todas as minhas ideias grandiosas. Eu posso precisar de vassalos para me ajudar, mas talvez colocar outras pessoas no comando só cause problemas. No momento, eu estou no vazio, decidindo.
Cansei de esperar por ideias (é, eu não tive ideias ainda), e criei um semideus pra me ajudar. Chamei-o de Ralf. Ralf é um cara esperto, ele já nasceu me sugerindo uma ideia (tudo bem, ele nasceu para sugerir ideias, mas não pensei que ele faria isso tão rápido). A ideia dele foi: criar um núcleo de poder centralizado cercado por “braços” (eu achei a palavra feia, mas não tive ideia melhor, além do mais, a logística do projeto se encaixa com o nome) e semideuses para controlar cada “braço”. Eu viajei enquanto ele me explicava o projeto: fiquei pensando que, se eu criei o Ralf, logo, ele era parte de mim. Uma parte de mim que representava algo que já existia aqui dentro, mas que eu negava, por algum motivo. Sendo ele parte de mim, eu podia interagir com ele como se ele fosse eu mesmo, mas ele não podia ter o mesmo controle sobre mim. Fiz ele dar um soco em si mesmo no meio da palestra. Foi engraçado, mas doeu em mim. Tenho que melhorar isso.
Descansei da falação do Ralf e comecei a criar. Primeiro eu tentei formar alguns elementos básicos para começar a formar o resto, como massinha de modelar. Mas não deu muito certo: estava tudo escuro. Não queria depender do Ralf (mesmo ele sendo parte de mim) e resolvi criar eu mesmo a solução: um interruptor. Quando eu o acionei, tudo ficou visível, e ficou muito mais fácil de criar. Coloquei os elementos iniciais numa gaveta, eles poderiam ser úteis. Comecei de novo.
Ralf me sugeriu criar trocentos elementos diferentes, que juntos formariam uma coisa só, que seria uniforme e perfeita. Eu não gostei muito da ideia, daria muito trabalho. De novo pensei: se o Ralf faz parte de mim, aquela ideia seria algum tipo de fetiche meu reprimido? Fiquei um pouco perturbado com esse pensamento, então resolvi parar de criar por agora.
Ralf veio conversar comigo. Ele falou que também fica perturbado às vezes, por ele ser eu e eu ser ele. Isso é tão confuso. Mas um sentimento engraçado me atingiu, quando eu percebi que meu sentimento era compartilhado. Tenho que dar um nome pra isso. Só sei que isso me animou a criar novamente.
Primeiro criei um núcleo centralizado, cheio de coisas brilhantes que o Ralf carinhosamente apelidou de estrelas. Acho que o nome vai pegar. Mas isso foi estressante, baseado em tentativa e erro, e eu fiquei exausto. Precisava de criar algo que facilitasse o descanso, uma coisa que fosse confortável. Ralf me sugeriu (já estava começando a ficar irritado com ele se intrometendo em tudo) criar algo na horizontal, e em seguida explicou o porquê disso de acordo com a Física. O que diabos é Física?
Apesar da minha descrença em relação à essa ideia, resolvi fazer o que ele sugeriu, e criei uma coisa que chamei de cama. Ralf achou muito simples, mas eu gostei, representava perfeitamente o propósito dela, simples e confortável. Apaguei o interruptor e desmaiei no confortável abraço da melhor criação desse universo.


Pequena tentativa de desabafo

Não sei porque às vezes eu me sinto tão cansada. Tão cheia de tudo. Velha demais para o mundo em que vivo.
Queria entender a razão de tanto desânimo. Perco a vontade até de entender isso. Não aguento mais essa rotina, esse computador. Dá vontade de deitar e morrer.
Seria mais fácil se eu pudesse explicar isso aos outros. Então não teria que ouvir tanto sermão, tanta ironia, tanta raiva. Se entendessem que eu não sinto vontade nem de mexer... quanto mais de digitar isso para que entendam, ou de falar, ou de arrumar meu quarto, reunir a bagunça que fiz, ligar pra alguém...
Parece um início de depressão. Aquele momento em que nada te atrai, mas ficar sem fazer nada é pior. Então você sente vontade de ler, de escrever, de botar pra fora essa coisa, mas aí você pega o papel, o lápis, e é só desânimo...
Que chato ser um ser humano complexo. Que chato ter um cérebro que quer entender o que não pode ser explicado, que quer explicar o que não pode ser entendido.
Essa vontade louca de que me entendam! Essa vontade louca de me explicar! Esse sentimento horrível de que isso é impossível! Mais uma vez eu estou aqui, escrevendo, explicando que eu quero explicar uma coisa que está dentro de mim, mas que não consigo tocar... Já fiz músicas, poemas, escrevi no blog, e estou escrevendo de novo, mas não sai. Nunca sai. Nunca entendo. 
Será que isso que gera esse desânimo de agora? Será que é isso que gera esse medo constante? Nem o meu medo eu sei explicar. Talvez eu tenho medo de mim. Talvez eu esteja cansada de mim.



All the things SHISEI are held


A mais profunda escuridão. Eu não via. Mas existia. Não havia tempo ou espaço. Só havia eu, flutuando no vazio.
Uma luz surgiu, minúscula. Quem a colocara ali? Ninguém. Só havia eu. Então, como ela surgira?
Aproximei-me dela. Parecia formada de muitas coisas. O vazio ao seu redor era deformado, e a luz pulsava. Toquei-a, mas acho que não devia tê-lo feito. Pois assim foi criado O Universo.
Explodiu. As partículas se espalharam; algumas se chocaram, formando partículas novas. Por onde elas passavam, formava-se a malha do tempo-espaço e tudo passou a existir. Uma centelha de luz acompanhou cada partícula, e elas se espalharam até eu não conseguir mais vê-las. As únicas coisas que sobraram foram eu e a centelha e luz original, que parecia falar comigo. Ouvi-a. Não havia palavras, mas sim o desejo de criar.
Criei.